Ecologia linguística e cultural de Angola: heterogeneidade, comunicação e identidade

Paulo Osório, Margarida Petter, João Ima-Panzo

As políticas linguísticas são sempre matéria por excelência do foro educativo, envolvendo-se também nestas duas realidades os contextos socioculturais, já que, quer a educação, quer a língua, como fator identitário e na sua função social de comunicação, devem, por sua vez, refletir a heterogeneidade de realidades locais. Entre investigadores e académicos angolanos mantém-se a reflexão sobre a particular ecologia linguística do país, marcada pelo entorno geográfico de territórios africanos de língua oficial francesa e inglesa, e pela existência de uma língua oficial veicular em contacto com muitas línguas autóctones, algumas delas com estatuto de línguas nacionais.

Daqui resulta um processo de nativização daquela língua oficial, cuja natureza veicular aumenta à medida do prestígio social e político que adquire. Resulta também a discussão sobre a pertinência de um ensino bilingue (português e línguas nacionais) ou, como tem sido prática, de um ensino basicamente monolingue, apoiado maioritariamente na língua portuguesa. Sob o ponto de vista sociológico, ainda não está fechada a questão da maior ou menor identificação dos falantes angolanos com a língua portuguesa ou com as suas línguas autóctones. No entanto, parece ser consensual que o português é a língua de união entre todos os falantes angolanos, uma vez que, tomando apenas como ponto de referência as línguas nacionais, a referida função social da comunicação seria praticamente impossível, em virtude de tais falantes apenas conhecerem as respetivas línguas da sua região. Por razões políticas, parece que as autoridades têm lutado pela manutenção e defesa da língua portuguesa e, sociolinguisticamente, a população tende a seguir a norma europeia do português, considerando-a verdadeiramente a norma de prestígio. Todavia, os múltiplos estudos no âmbito da linguística também têm mostrado que o português de Angola se diferencia de outras variedades da língua, e assume traços próprios e distintos das normas europeia e brasileira instituídas, sejam sob o ponto de vista fonético-fonológico, morfossintático, semântico ou até mesmo pragmático.

Sendo a língua um fenómeno social e político, este painel aceitará contributos que podem ir para além da própria questão estritamente linguística, uma vez que Angola convoca questões muito complexas do ponto de vista político, sociológico, antropológico e educativo. Encarar alguns destes fenómenos anteriormente apontados exige, obrigatoriamente, a revisitação histórica da identidade angolana, nomeadamente no contexto da colonização e, posteriormente, no âmbito da sua independência, não esquecendo o período de guerra por que passou.

Deste modo, poderão ser submetidas ao Painel comunicações que abordem as seguintes temáticas:

1. Configuração sociopolítica de Angola; desafios do seu potencial económico para o desenvolvimento da língua portuguesa; políticas linguísticas para o português de Angola.

2. Angola enquanto mosaico étnico, linguístico e cultural; o sistema educativo angolano e uma reflexão crítica sobre o ensino bilingue (português/línguas autóctones) e/ou monolingue (língua portuguesa).

3. Papel das línguas africanas de Angola no património linguístico nacional; estudos comparativos, questões linguísticas e históricas; o desafio da cooficialização de várias línguas na ecologia multilingue de Angola; a agenda intelectual e académica quanto a recursos linguísticos.

4. Descrição linguística do português de Angola sob enquadramentos teóricos e metodológicos diversificados; caminhos para a construção de uma norma culta ou norma-padrão da variedade do português angolano.